domingo, 16 de agosto de 2009

DE PÉ ESQUERDO



Existem dias em que acordamos com o pé esquerdo e nada dá certo. Se percebêssemos isso antes, voltaríamos para cama e acordaríamos novamente só para ter a oportunidade de tentar viver o dia de forma diferente! Tive um dia desses! Lembro-me que, para mim, seria mais ou menos um dia comum, pois era sexta-feira. Iria para o trabalho e depois, para casa. Meu namorado estava de plantão e não iríamos nos encontrar. Mas, logo cedo, recebi seu telefonema pedindo-me para levar sua mãe a um casamento de um parente distante. Eles se lembraram em cima da hora e não deu tempo dele trocar o plantão com um colega. Para mim, iria ficar em casa, descansando, mas, o namorado e a sogra pediram, como iria negar?

Bem, a manhã não foi tão ruim. Fiquei um pouco atarefada porque precisaria sair mais cedo para almoçar, aliás, para ir ao salão fazer uma bela escova. O casamento seria às 19:30 H e não daria tempo após o expediente, pois tinha que fechar a Folha de Pagamento até às 18:30, ou acabaria chegando atrasada ao casório.

Consegui um encaixe no salão, mas, sexta-feira, sabe como é: aquele encaixe! Tive que esperar um bocado, mas consegui. Meu cabelo ficou lindo! Cheguei apenas vinte minutos atrasada no trabalho. Já estava azul de fome, então, pedi um sanduíche. Quando minha refeição chegou, nem pude sentir o gosto, a devorei em cinco minutos. Era hora de continuar, pra valer, a árdua tarefa de terminar toda a Folha de Pagamento a tempo.

Estava indo bem. Nada aconteceu para desviar minha atenção e fazia um trabalho bem veloz, até que, lá para o meio da tarde, caiu um pé d 'água daqueles. Todo mundo adorou, pois já estávamos sem chuva há pelos menos dois meses e meio. A seca de Brasília não é nada fácil! Mas eu logo pensei: "E agora? Já era minha escova! Nem guarda-chuva trouxe! "Se bem que poderia dar sorte. Ainda tinha duas horas e meia para a chuva acabar. Não deixei que isso perturbasse minha atenção. Continuei, firme e forte.

"Pronto! Terminei!" Pensei. Estava feliz! Havia acabado tudo e só atrasei mais vinte minutos. Aqueles malditos da hora do almoço. Mas, olha que coisa boa: a chuva havia passado. Despedi-me de meus colegas e corri para o estacionamento. Não acreditei quando olhei para meu carrinho. Eu tinha mandado lavar quando voltei do salão, mas o havia estacionado embaixo de uma árvore, crente que iria fazer um baita sol. Não acreditei! Toda a sujeira de dois meses e meio que estava em cima daquela árvore agora estava em cima do meu carrinho branco, aliás, preto! Estava nojento! Além da sujeira, havia pequenos galhos e folhas para todo lado. Tristemente, entrei. Pensei em pegar o celular e dizer para minha sogra que nós deveríamos pegar um taxi. Mas, quando chegasse na casa dela resolveríamos isso juntas.

Apesar do trânsito terrível, típico de dia de chuva, cheguei em casa. Já estava em cima da hora. Tomei um banho de dois minutos e coloquei um vestido. Preto, claro! De qualquer jeito, qualquer cor iria acabar ficando preta, mesmo. Melhor prevenir. Cheguei na casa da sogrinha. Ela estava linda, mas com uma cara! Levei logo um sermão por ter chegado atrasada. Pior foi quando contei que não dava para ser no meu carro. Ela já tinha gastado um bom dinheiro com o presente e acabou me convencendo a ir no meu mesmo. Fazer o quê? Era final de mês e eu não também não estava com recursos sobrando para ir e voltar de taxi para um local tão longe. Perguntei se teria Serviço de manobrista, pois pagar íamos o maior "mico", mas ela disse que não se importaria de pagar "mico "para o manobrista. "Tudo bem, então vamos! "Disse sem retrucar.

No caminho, começou a chover novamente. E eu, com aquele mapinha na mão, sem entender bulufas e sem enxergar um palmo diante do meu nariz, ou melhor, diante do pára-brisas. Lendo o "bendito "mapa errado, acabei virando onde não devia e "Pou" que buraco era aquele! Bom, tive que ver pelo lado positivo: o pneu não furou. Não foi maravilhoso? Mas o barulho que meu carro estava fazendo, percebi que o escapamento estraçalhou. "Ao menos anda! "Pensei. Tudo bem, resolvemos retornar o carro, ficar no cantinho da pista e esperar a chuva passar. Ao longe vimos vários carros entrarem no mesmo lugar. Naquele deserto, só podiam estar indo para o casório. Então, deduzimos que teríamos que ir para aquela direção e lá fomos nós.

Conseguimos! Atrasadas, sim, mas inteiras, ou quase. Todos que estavam por lá olharam para nós. Estávamos, realmente, chamando atenção. Mais ainda do que havia imaginado. Antes, o "mico "fosse só com o manobrista! Olhei para minha sogra e tive vontade de esganá-la, mas sorri, claro! Tudo bem, ao menos os noivos estavam lá dentro do salão de festas, porque já havíamos perdido a cerimônia. Então procuramos entrar sorrateiramente e cumprimentar os noivos e seus pais, como se tivéssemos assistido tudo.

A festa foi muito divertida. Dançamos, comemos, bebemos, rimos, etc., até esquecemos de tudo que havíamos passado, se o destino não nos tivesse pregado mais uma de suas surpresinhas. O irmão da noiva era bem jovem, por volta de dezessete anos e resolveu comemorar o casamento de sua maninha tomando seu primeiro pileque. Quando percebemos, a bagunça já havia começado. Foi cadeira para um lado, mesa para outro, até que todos começaram a correr para fora. A festa havia acabado! O anúncio foi da mãe da noiva, que pedindo desculpas pelo acontecido, não conseguiu esconder que estava quase tendo um enfarto. "Eta, filho irresponsável! Não queria estar na pele dele quando todos estiverem em casa!" Era o comentário dos convidados. Mas, na verdade, ao ver aquela multidão aguardando seus carros, não sei quem estava em pior situação. Se ele, ou minha sogrinha e eu. Os manobristas começaram a retirar os carros do estacionamento. Como nós fomos as últimas a chegar, adivinha qual o primeiro carro a ser retirado? Tivemos que entrar naquela maravilha silenciosa com o sorriso amarelo daqueles. Boa noite, amigos, boa noite! Pra você ver, ainda tem quem defenda sogra.
E nada o impede de chegar ao seu destino.

A FORÇA DO AMOR




Camile, uma linda moça de classe média baixa, cresceu em um ambiente em que não se acreditava no amor entre um homem e uma mulher. Sua família sempre dizia que o amor, como aqueles, cinematográficos ou conto de fadas, não existia; que muitos o confundiam com a paixão. A paixão é um momento feliz com alguém que se quer bem. Pode durar um dia, ou anos. Deixa o apaixonado sem fôlego e aéreo. O amor, só existe se direcionado a um amigo, um irmão, um pai, uma mãe. Por isso, no casamento, ele acaba surgindo. Nascem “gêmeos múltiplos”, como sua mãe dizia. Com ele vem a falta de vontade de namorar, beijar na boca, fazer amor, passear de mãos dadas e, assim, sucessivamente, até o fim. Todo esse conceito deturpado foi base da formação de sua personalidade: forte e determinada; decidida e prática; romance não fazia parte de seus planos. Nunca Camile imaginaria que sua base fosse retirada como um tapete e que ela pudesse ficar flutuando, como em nuvens.

Tudo aconteceu em uma de suas viagens, a trabalho, para África. Ela era Assistente Social e Repórter, mas nesse caso, ela iria cobrir uma reportagem de uma doença avassaladora que estava tomando grande proporção em uma cidade africana que falava a língua portuguesa. Ainda não sabia-se muito a respeito, mas ela não tinha medo de nada. O que ela queria era uma grande promoção no jornal, não importava o preço.

Chegando no local, que não era nada turístico, após hospedar-se como podia, Camile começou sua jornada de pesquisas. Filmando tudo que parecia interessante, interrogando tantos quanto pudessem acrescentar em seu trabalho, conheceu um médico que estava lá, simplesmente, para ajudar os enfermos. A mando de ninguém, Dr. Floriano, que morava nos Estados Unidos há mais de 10 anos e mantinha uma clínica de dermatologia de grande sucesso no local, abandonou tudo para atender pacientes atingidos pela nova doença que, por sinal, era manifestada na pele. Sua mãe já havia morrido por causa dela, o que o motivou a voltar a sua terra e ajudar a população. “A África é minha origem; os africanos meus irmãos!” Dizia ele, com orgulho.

Dr. Floriano era um mulato muito bonito. Descendente de africano e alemão, os raros olhos verdes destacavam empele morena. Camile ficou impressionada em todos os sentidos. Ele era uma pessoa que cresceu na vida, por esforço próprio; venceu discriminações e desafios e conquistou respeito e um espaço profissional. Mesmo com tantas vitórias, o sucesso não lhe subiu a cabeça e permanecia uma pessoa humilde, de bons princípios e um coração tão humano, quanto puro. Também ficava impressionada por ele não temer ser contagiado pela doença, mas se entregava a ajudar quem estava precisando de seu conhecimento. Ele fazia pesquisas em busca da descoberta da vacina. Colaborou no que pôde para ajudar Camile em sua reportagem. Dizia que era muito importante, até, mesmo, para levantar patrocínio para a descoberta da cura. Camile permaneceu com Floriano por cinco semanas e teve que voltar para o Brasil.

Camile chegou com informações suficientes para uma grande reportagem. Conseguiu a promoção que queria em seu emprego, mas seus pensamentos continuavam lá, com Dr. Floriano. Mas não era só o trabalho que a prendeu tanto tempo na África. Surgiram vários climas de romance entre os dois, mas ela resistiu. Fugiu de todas as tentativas do doutor. Deu várias desculpas e, ao final, confessou que não acreditava no amor e não queria se envolver com ninguém. Agora no Brasil, havia se arrependido de seu comportamento. Seu respeito por ele não poderia tirar os conceitos sobre o amor, que a seu ver, só levavam ao sofrimento. Tentou esquecer o que viveu, mas até seus sonhos a traíam durante os próximos dois meses.

Foi então que, durante uma notícia, resolveu voltar à África. Camile ouviu que a doença havia tomado uma proporção maior. Então, começou a fazer as malas e correu para o aeroporto. Esperou por muitas horas até que conseguiu partir. No avião não acreditava no que estava fazendo. Quantas pessoas queriam correr de lá e, ela, correndo para lá. “Só posso estar maluca!” Pensava. Mas seus sentimentos não a deixavam agir com coerência. Ela queria estar lá o mais rápido possível. Quando chegou, foi direto a procura de Floriano e descobriu que ele também estava doente. Mas ainda assim, estava trabalhando.

Camile, ao chegar em sua sala de pesquisas correu para abraçá-lo, mas ele se esquivou para não contagiá-la. Estava todo coberto com panos, inclusive com uma máscara. A doença era transmissível ao toque, também. Ela não resistiu e chorou. Ele, sem poder tocá-la, apenas sentou-se e via-se as lágrimas escorrerem sobre sua face. Ela se acalmou e assim, puderam conversar. Existia uma esperança. A vacina estava prestes a ser descoberta. Ele havia descoberto o agente causador. Era um vírus que se manifestava mediante a picada de um barbeiro que havia na região, ou contato com as secreções das feridas de um humano infectado. Mas era possível reverter as consequências que o vírus trazia para o organismo. Ele estava quase conseguindo, quando adquiriu a doença, o que atrasou o processo, pois suas mãos estavam cheias de escamas, impossibilitando a manipulação de certos objetos que precisava para concluir seu trabalho. Pediu ajuda a Camile, se ela não tivesse medo de se envolver mais naquela história, claro. Ela não pensou duas vezes e seguia todos os passos ordenados pelo doutor.

Foi mais uma semana de trabalho para chegar ao resultado final. Havia a vacina, para aqueles que ainda não haviam sido infectados e o antídoto, para os que já estavam doentes. Ele, mesmo, foi a cobaia. Já estava sem forças e, às vezes, deixava escapar uma desesperança em um resultado para ele, pois a doença já estava muito avançada. Camile não perdia as esperanças e colocou o antídoto em um soro, conforme orientação de Floriano. Dois dias se passaram e Floriano estava inconsciente. Camile, que já tinha tomado a vacina, passava dia e noite ao seu lado.
No início do terceiro dia, pela madrugada, Floriano se moveu e balbuciou algumas palavras. Camile acordou e ficou super feliz. Ela o acariciou e disse:

_ Meu amado, acorde! Acorde, pois preciso de você aqui, comigo, para sempre.

Ele abriu os olhos e sorriu. Depois, em voz bem baixa, mas com ótima dicção, disse:

_ Estou melhorando! Você conseguiu...

_ Nós conseguimos!

_ ...mas você disse que não acreditava no amor... o que mudou?

_ É... você pode esquecer aquelas minhas palavras. As disse porque eu não conhecia o amor. Agora eu conheço. E aquele que conhece, jamais o confundirá com paixão. Eu só lamento pelas pessoas que não o encontraram, pois é mais real do que a minha própria vida; é um sentimento que só pode vir de Deus, porque não é inconsciente, nem nos deixa aéreos, pelo contrário, nos deixa fortes e em condições de enfrentar qualquer coisa, inclusive a morte.

GRITO PATRIOTA





















Brasil da diferença e desigualdade;
Tudo por poder, status e dinheiro mundano?
Para que, Brasil? Por que?
O que te cegas, te deixas desumano?
Por que não pactuas com a verdade?

Tanta beleza se espalha em terra fértil,
Espaço quase infinito e água doce suficiente!
Das florestas podemos obter saúde,
Da terra combustível e alimento precioso,
Do povo, a força do trabalho e a garra de ser gente.

Povo lutador e resistente.
Em muitos olhos do Sertão vemos esperança;
Supera a degradação daquele que confiou:
Perdoa, confiando novamente.
É traído, castigado e desiludido,
Mas levanta-se, renova-se e vai em frente

Motivo, não se entende.
Tantos com tão menos
São respeitosos e coerentes:
Integridade, Fraternidade e Igualdade
O que fazer por essa contemplação?
Se com tanto, se faz tão pouco
Nada é suficiente?

Da Riqueza não se faz riqueza?
Da Beleza não se faz beleza?
Da Força não se faz poder?
Se tudo temos e nada temos,
Como alcançar tamanha solidez?

Liberdade, esta conquistamos!
Por isso, só por isso, sorrimos.
Estômago vazio e alegre semblante
Diante de tanto desgosto
É o que traz o brilho nos olhos de tanta gente
Arraigado na esperança declarada: Não estou morto!

Grande problema é a ética.
Ah, como esta anda sumida!
Em seu lugar se acomoda o “jeitinho brasileiro”
Tão acolhido, não se percebendo o veneno
Xô, praga maldita, que deturpa o entendimento!

O que escolher, afinal?
Mudar de forma original?
Que tal a atitude buscando a coragem conhecida,
A notável paciência e força calejada?
Cedo, desde o berço aprendendo,
Quem sabe se absorve princípio tal.

Deixar de lado a vantagem banal,
O proveito ilegal,
É questão de consciência, mudança
Um Brasil íntegro, cheio de bonança
Cabe a mim, a ti... a nós,
Certamente teremos grande herança.

LEMBRANÇAS QUE AFAGAM





















O odor singular enche o ambiente,
Levando-me a utilizar todos os sentidos de meu corpo
Como se real fosse esse momento.


Não, não resisto! Porque se me contivesse
Perderia aquilo que me sustenta e me acolhe.
É um sentimento que transcende,
Um espetacular minuto envolvente
Que me faz forte para prosseguir e chegar ao topo
Sem me perder, retroceder, ou ser levado ao vento.


A cumplicidade entre nós me traz saudade!
Duas almas em uma, sim, completas em lealdade.
Se triste, seu sorriso e carinho eram como um banho quente.
Se me sentia acuado, você era meu monte seguro.
Pelo olhar já sabíamos o que se passava na mente.
Os simples gestos demonstravam o sentimento fiel e puro.


Ah, meu amor, se possível fosse mudar o destino!
Toda distância seria pequena para te encontrar;
Nenhum obstáculo seria suficiente para me parar;
Qualquer boca maldita seria pouco para me desencorajar.


Mas quem pode intervir nas linhas traçadas do Divino?
Quem pode uma página escrita modificar?
Ou inocentes manchas de sangue apagar?
Resta apenas deixar que tais lembranças venham me afagar!


Sim, me afaguem, por favor! Inconformado ser que me tornei!
Quem dera ao menos pudesse mudar o que em mim se fez,
O coração ferido muito influencia meu jeito, eu sei.
Transtornado e avoado sim; duro, insensível, talvez.
Não posso, porém, esquecer-me daqueles que aqui ainda estão.
Como me arrependeria se tarde demais valorizasse o amor presente!
Consolo maior na angustia são todos que me deram a mão.
Não se importam se molho seus ombros, mas me faço ausente.


Minha alma estremece mesmo rodeada de tanta compreensão.
Talvez o tempo possa levar consigo alguma dor, quem sabe?
Deixando-me recordar de tudo sem tristeza, mas com sorriso são,
Com esperança de reviver e receber, ainda, o que do céu me cabe.

FUGINDO DA REALIDADE


Talvez não consiga descrever-te tudo para que me entenda.
Tentarei, preciso desabafar, não posso conter-me
Ou tantas imagens perdidas me farão enlouquecer,
Luzes, ruídos, odor, por favor, faz-me compreender!

Não me lembro bem, foi rápido, injusto, impactante.
Tentei por todos os meios possíveis, nisso acredito!
Sim, e por isso senti-me e sinto-me impotente.
Ah, se pudesse voltar atrás e tentar novamente,
E se uma atitude nova tornasse tudo diferente?

Acalme-se, meu amigo! Os detalhes virão à tona, tente!
Foi um impacto forte, sim, para qualquer ser vivente.
Lembranças que querem se apagar, sumir ao vento.
Mas voltemos ao início, apenas relaxe, seja paciente.

Sim, preciso meus impulsos controlar.
Conseguindo, porém, como hei de minha perda suportar?
Ter a certeza do meu fracasso, culpa, ou descaso
Seria como uma faca em meu peito, atravessada ao acaso.

Ao acaso? Não, certamente, a palavra não está bem empregada.
Afinal, se culpa ou descaso for comprovado,
Seria como se planejado eu tivesse todo o ocorrido!
Talvez melhor fosse permanecer o mistério oculto,
Esquecer-me do que ainda me assombra, me acovarda.

E se constatado seu fracasso ficasse?
Acaso não seria melhor saber que ao menos tentou?
Todos podem falhar! Somos imperfeitos, como se já não soubesse!
Dependemos também de sorte, de ajuda, nisso já pensou?

Quem sabe a razão contigo está; é possível!
É verdade que “fracassar” é um verbo a ninguém desejável,
Mas diante de meus temores se torna até afago.
Esperança vejo; quem dera em minha mente menos estrago!

Entrego-me agora à sua experiência e sabedoria.
Como queres, voltaremos a quando tudo começou.
Mas se perceberes que meu temor não é ilusório, mas real,
Minta, engana-me, mas não posso conviver com vergonha tal.
Se és meu amigo, venha, envolva-me em sua filosofia.

O que pensas de mim? Quero ajudá-lo a enfrentar sua dor!
Mascarar a verdade? Acha que isso é cura?
Sofres de um mal maior que pensava! Mas nada posso propor-lhe,
Caso não amar a si mesmo, como poderás fugir da morte?

Ah, a morte! Talvez seja essa a saída latente!
Quem dera fosse eu no lugar de meus queridos!
Ou naquele dia infernal também tivesse com eles ido,
E assim, o esquecimento invadiria minha mente.

Nem dor, confusões, culpa ou desilusões.
Tudo passaria, como se nada ocorrido tivesse;
Longe dos pensamentos, longe de incompreensões.
Vazio, como se nenhum sentimento houvesse.
Existir seria passado! Ah, se o nada me sobreviesse.

Não sabes o que dizes, homem rebelde!
Cala-se! Não se acovarde diante das duras circunstâncias!
Quem disse que a morte é vazio, ou nada? Essas são suas ânsias!
É apenas uma passagem para uma vida melhor e distante.

Essas são palavras que me laçam! Como sempre a razão em você impera.
Envergonho-me por tal comportamento: vil e insano;
Deixei-me levar pela dor que me devora,
Meses que me tornaram febril e insensato

Ah, meu amigo, o que seria de mim sem tua firmeza?
Preciso, sim, de ajuda, pulso forte que me domine.
Alguém que me leve de volta à realidade, não se omita, destrua minha fraqueza.
Não atente para minhas loucuras, ou com elas se intimide.
Preciso enfrentar, quero enfrentar, por mais duro que pareça.

EU, ABDUZIDA




Dia de sol e clima quente, ou noite serena e clima ameno, nada disso era suficiente para me fazer abrir um sorriso. Eu era bem jovem naquela época, mas havia acabado de passar por uma experiência extremamente impactante. Todos diziam: “katarine é a moça mais bonita do bairro”, mas depois de tudo o que passei só conseguia ver através de meus olhos a escuridão que se encontrava a minha alma. Não havia mais beleza, apenas um rosto inchado, vermelho e olhos opacos; uma tristeza que, para mim, era plenamente compreensível. Mas não entendia o motivo de não conseguir virar a página da minha vida, mesmo depois de duas semanas. Alguns diziam que com o tempo iria melhorar, mas não consegui sentir a tal melhora. Não é fácil, eu sei! Tinha acabado de perder as pessoas que mais amava: meu futuro marido, meus pais e meu único irmão. Sentia-me sozinha, desamparada e sem direção. Mas já era tempo de eu enfrentar o ocorrido e viver, só não encontrava forças para prosseguir. Estava, realmente, desistindo. O sol nascia e dormia, mas meu o corpo não acompanhava o ritmo do dia e da noite. Nem meu organismo sentia mais forme ou sede. Às vezes comia e bebia algo para não morrer, mas era totalmente forçado e em pouca quantidade. Fiquei magra, desnutrida, mas não me importava com isso. Aliás, nada mais me importava. Muitas vezes virava a noite chorando e durante o dia apagava de tanto cansaço.
Pensei que jamais iria passar por outra experiência ruim em minha vida. Mas estava enganada. Em uma noite de sexta-feira, um novo bombardeio veio sobre mim. Lembro-me que fui à janela de meu quarto e fiquei olhando para o céu. O vento batia em meu rosto trazendo o odor da chuva que caia em um lugar próximo, o que só fazia com que as lágrimas escorressem mais e mais. A sensação era tão agradável, mas me fazia recordar de alguns momentos felizes, o que me enchia de dor por constatar que não os viveria mais. Eu me desesperei. Olhei para minhas mãos e lá estavam as duas alianças: a minha e a de Moisés. Estava com remorsos por ter dito, no dia anterior a sua morte, algo que o magoou. Não acredito que disse que era jovem demais para assumir um compromisso com família e filhos! Então eu fechei os olhos e arranquei as alianças com violência jogando para fora da janela. Fui tomada por múltiplos sentimentos que entraram em conflito: fracasso, remorso, saudade, dor, fúria, e vontade de ser feliz novamente. Saí do quarto correndo e joguei para longe todos os porta-retratos que estavam espalhados pela casa. A única coisa que não queria naquele momento era lembrar-me das cenas que vivenciei. Então, depois da crise, encostei-me na parede e escorreguei até me sentar, atônita. Fiquei assim por alguns segundos, mas uma luz que vinha do quarto me chamou a atenção. Corri para lá e me deparei com minha família e meu noivo. Enlouqueci. Comecei a gritar. Então eles se aproximaram e taparam minha boca, segurando-me para que eu não fugisse. Uma luz forte veio sobre nós e essa foi a última coisa que me lembro antes de acordar em uma sala muito clara. Havia algumas pessoas em minha volta conversando em uma língua estranha. Por um momento pensei que havia morrido, mas me belisquei e vi que ainda tinha carne e osso. Percorri com os olhos para ver se achava minha família e meu noivo, mas nada encontrei.

Aquelas pessoas conversavam entre si e me olhavam. Eu era o assunto, provavelmente. Fiquei curiosa demais e acabei chamando a atenção daqueles homens que vieram em minha direção. Fiquei com medo, mas esperei para ver o que eles queriam. Eles me perguntaram alguma coisa, mas não entendia a língua. Até que um deles tocou com o dedo indicador em minha testa e em segundos se transformou em mim. Fiquei perplexa com o que vi. Era como se me olhasse no espelho. Percebi, então, que estava lidando com algo não humano, um alienígena, quem sabe. Assustada, tentei sair daquela sala, mas um deles fez um gesto com a mão na frente de meus olhos e fiquei imóvel. Não tinha mais controle sobre meu corpo. Ele me colocou deitada novamente e obedeci como um cachorrinho, sem resistência. Aquilo foi incrivelmente estranho. Parecia algum tipo de hipnose. Antes de saírem do quarto, o ser que tomou a minha forma disse em minha língua para eu me acalmar, pois quanto mais resistisse, mais demoraria a minha volta para casa. Então decidi obedecer, mas não conseguia dizer isso a eles. Fiquei de castigo naquela posição algumas horas.

Que sensação horrível foi aquela! Um minuto parecia uma hora. Parece que o corpo inteiro resolve coçar e eu incapaz de resolver a situação. Naquele momento comecei a sentir fome e sede. Por incrível que pareça, quando uma daquelas criaturas apareceu na sala senti-me aliviada. Ele fez outro gesto na frente de meus olhos e lá estava eu com todos os meus sentidos e movimentos novamente. Ele carregava em uma das mãos uma bandeja com alimentos, mas só bebi o líquido. Parecia um tipo de suco concentrado. O sabor não era nada agradável, mas estava com muita sede para recusar. Ele esperou eu beber o suco e logo depois me perguntou se eu iria deixar eles me examinarem. Estranhei por ele estar falando a minha língua. Ele disse que queria conhecer os sentimentos humanos, pois me observaram na terra e perceberam que eu emanava energias devastadoras durante o momento em que estive deprimida. Ao mesmo tempo, eles se surpreenderam com as energias que saiam de mim quando eu estava feliz. Disse-me que elas eram capazes de curar doenças. Disse-me, também, que eu era uma das pessoas mais emotivas da Terra e que precisavam pesquisar o poder dessas emoções. Aproveitei para perguntar que lugar era aquele em que eu me encontrava. Era um Planeta chamado Noshie. No mundo deles os sentimentos não eram conhecidos. Muito menos o poder que pode emanar desses sentimentos.

Os Noshienianos eram evoluídos demais ao ponto de adquirir a característica humana. Viviam entre nós para fazer suas pesquisas, mas nunca conseguiram entender nossos sentimos. Até esse momento eu os compreendi; é absolutamente compreensível a curiosidade, o desejo de evoluir com a experiência dos outros. Até me dispus a ser objeto de pesquisa. Não tinha mais nada a perder na minha vida e acreditei que seria bom ajudar alguém a adquirir algo importante para seu desenvolvimento. Mas sem querer, aquela criatura, que se chamava Jubsh, revelou que foram eles os responsáveis pelo massacre de minha família e do meu noivo. Não pude acreditar que para pesquisar sobre energias dos sentimentos alguém pudesse fazer tanto mal a outra pessoa, mesmo que não fosse de sua mesma natureza. Então, enlouqueci de vez. Quebrei toda aquela sala. Os outros alienígenas entraram e quiseram me imobilizar novamente, mas Jubsh não deixou. Disse que queria gravar toda a minha reação. Eles eram insensíveis ao ponto de fazer tal crueldade em nome de seus estudos, sua ciência. Isso era inconcebível para mim! Eles tiveram a coragem de torturar e assassinar as pessoas que eu amava enquanto eu assistia a todos os atos de crueldade presa a uma cadeira, amordaçada. Nunca me esquecerei daquelas cenas de terror e violência. Aqueles seres são indescritivelmente desumanos.

Depois de ter soltado todo o meu furor em cima deles, fiquei tão cansada ao ponto de desmaiar. Acredito que a má alimentação durante todos aqueles dias começou a me trazer conseqüências ruins. Quando acordei, lá estava eu, novamente, naquela maca. Só que desta vez estava nua, cabeça raspada, tomando algum tipo de soro colorido na veia, cheia de fios grudados em meu corpo e toda furada de prováveis exames de sangue. Os insensíveis me pegaram de vez. Queria matá-los, se pudesse! Mas me sentia tão fraca que dormi novamente.

Quando acordei estava me sentindo melhor. A criatura que assumiu a minha forma veio retirar os equipamentos que estavam grudados em mim. Ele se chamava Roveloe. Ele me disse que o chefe deles queria me ver. Pediu que alguém trouxesse alimentos para mim e me deu uma roupa comprida, semelhante à roupa que eles usavam. Pediu que eu a vestisse para encontrar o Chefe Mor. O alimento tinha sabor parecido com os nossos, mas as cores eram tão gritantes que dava até medo de comer. Enquanto comia, conversei um pouco com Roveloe e descobrir que seu nome significa “sensato”, na língua deles. Ele me perguntou várias coisas sobre os sentimentos, como o amor, o ódio, a raiva. Falei, também, da inveja, do egoísmo, do medo. Ele não conhecia nada semelhante, mas me olhava com ternura. Então perguntei por que ele me olhava assim. Ele pensou, pensou e disse que não estava me olhando diferente, mas que no momento em que eu perguntei, desejava que eu voltasse a exalar as mesmas energias que me viu exalar quando estava feliz. Apontei para o seu peito e perguntei se ele sentia alguma sensação ali. Ele disse que não. Então eu disse que o que ele desejava para mim era bom. Querer bem significa amor, ternura, carinho. Deveria, então, sentir uma emoção naquela região. Ele sorriu.

Fui conversar com o Chefe Mor. Era uma sala enorme e muito mais iluminada do que a que eu me encontrava. Ele não tinha a aparência dos outros que se pareciam com humanos. Fiquei com medo, pois tinha o aspecto demoníaco misturado a uma criatura alada com olhos de leão. Perguntei se aquele era o aspecto original da espécie deles. Ele confirmou balançando a cabeça e pediu que eu me aproximasse. Hesitei por um instante, mas ele não demonstrava que queria me fazer mal, então me aproximei. Ele me tocou na testa e tomou a minha forma, assim como Roveloe. Entendi que eles assumem a última forma humana em que tocam. Era estranho olhar para mim mesma, mas me sentia bem melhor do que olhar para aquela figura demoníaca. Então, me senti mais a vontade para perguntar se a ciência deles era tão importante ao ponto de fazer mal para alguém, mesmo que essa pessoa não fosse da sua espécie. Eu desabafei. Disse que sofri muito por ter visto aqueles homens sacrificarem minha família. Fiquei sozinha, desamparada, desesperada. Eles conseguiram acabar com a minha vida em um só dia e nada mais fazia sentido para mim. Mas o Chefe Mor não parecia ter se comovido com a minha história. Friamente, disse que para eles não existe mal nem bem. Existe fazer o que é necessário. Se era preciso ativar as sensações que seriam estudadas, então, tinha que ser feito. Disse que me chamou ali não para perguntar e sim para responder. Eu fiquei indignada; chorei; xinguei aquele ser desprezível de tudo quanto era nome horroroso que conhecia e o ataquei. Ele simplesmente levantou a mão e fez aquele gesto que me deixou imóvel. Mas mesmo inerte consegui impressioná-lo de alguma forma. As lágrimas continuavam a escorrer sobre a minha face porque meu interior continuava chorando, mesmo depois de ele ter me imobilizado. Ele se aproximou e ficou me olhando por alguns minutos. Então, pegou um objeto parecido com um frasco de perfume e colheu as lágrimas como amostra. Chamou seus súditos e saíram da sala me deixando ali sozinha por algumas horas.

Quando retornaram, ele disse-me que me mandaria para casa naquele momento e que devolveria o que me tirou, pois eu havia colaborado para que eles descobrissem algo que mudaria sua civilização. Uma luz forte veio sobre mim, assim como aquela que me levou para o Planeta Noshie. Quando dei por mim estava deitada em minha cama. Tudo parecia um sonho louco se não fosse minha cabeça raspada, os furos e hematomas pelo meu corpo. Abri a porta do meu quarto e quase caí para trás; meu pai estava lá, na minha frente. Por um momento pensei que fosse uma das criaturas transformadas, mas o carinho de meu pai me convenceu que era ele mesmo. Ele se assustou com a minha aparência, me perguntando por que estava careca, mas eu nem consegui responder. Corri para a cozinha gritando pela minha mãe e lá estava ela, linda como sempre. Só entendi o que aconteceu quando vi a data no jornal que estava sobre a mesa. Eles me devolveram para meu Planeta em um tempo passado, exatamente duas semanas e meia antes da tragédia. Depois de passar por tudo isso, tive que pedir desculpas a Moisés, meu noivo, mesmo que ele não entendesse o motivo. Afinal, voltei à Terra antes de dizer aquela besteira para ele. Foi engraçada a sua reação, mas levamos tudo muito bem, inclusive a minha careca. Disse que haviam me confundido com um calouro na faculdade. Belle, gostaria de estar te contando isso pessoalmente, mas estou morrendo e não dará tempo de você chegar da França, eu sei. Sabe o que quero dizer com toda essa revelação que mais parece uma loucura? É tão louco que nunca havia contado para ninguém, minha filha! Mas acredito que esta é a hora e a pessoa ideal; espero que te ajude a pensar melhor sobre terminar com Frenk. Ele esteve todo esse tempo comigo aqui no hospital. Ele te ama. E sei que você o ama também e não quero que perceba que fez uma terrível besteira tarde demais. Lembre-se que não existe nada no universo mais importante do que o amor. Nós tivemos o privilégio de conhecê-lo e temos que valorizar cada momento da vida, explorando esse sentimento sublime.